Ratos: O Pior Amigo Do Homem

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Um dia você resolve limpar a despensa de casa e – surpresa! – descobre que o lugar está infestado de ratos. Os sacos de comida estão furados e vazios, os livros foram roídos e nem as embalagens dos eletrodomésticos se salvaram. A presença dos bichos é repugnante, mas não há motivo para desespero, você pensa.

Afinal, há no mercado um arsenal de ratoeiras e iscas envenenadas. Depois de armar uma arapuca perfeita, você vai dormir sossegado, certo de que os intrometidos estão com as horas contadas. Doce ilusão. No dia seguinte, as armadilhas estão intocadas. Os ratos não deram nem uma mordida. Em compensação.

Devoraram mais um pouquinho da comida que restava, como se adivinhassem suas intenções. Como é possível que um animal tão menos evoluído que nós seja capaz de driblar a tecnologia mais moderna? Esses roedores são mesmo tão inteligentes? Bem, se os ratos fossem assim tão fáceis de derrotar, eles não seriam um dos inimigos mais antigos.

Segundo o zoólogo americano Anthony Barnett, já faz 10 000 anos que tentamos nos livrar deles. “Convivemos com os roedores pelo menos desde que a agricultura começou”, diz Barnett, professor emérito da Universidade Nacional da Austrália e autor do livro The Story of Rats (A história dos ratos, inédito no Brasil).

Depois de tanto tempo de convivência, não é de espantar que os dentuços tenham aprendido nossas manias e nossas falhas e desenvolvido truques para conviver conosco sem correr muito risco. Em alguns ramos da árvore genealógica dos ratos, essas mudanças já caracterizam uma evolução da espécie, um salto determinado pela convivência conosco.

Mas o convívio com a humanidade não mudou só a vida dos ratos. Segundo Barnett, esses animais, na mão contrária, alteraram a história da humanidade também. Especialmente na ciência, mas não só. Os gatos, por exemplo, que na antiga mitologia egípcia alcançaram o status de divindade, só foram admitidos nas casas.

Depois que as pessoas perceberam sua utilidade na caça aos roedores. Até na Bíblia os ratos mereceram citação. Em algumas passagens, escritas há 3 000 anos, eles são classificados como “impuros”. Os homens tementes a Deus deveriam manter distância deles. Essa rusga histórica teve dois momentos cruciais.

O primeiro deles foi a fundação das primeiras cidades, há 10 000 anos, que, desde então, propiciam uma fonte inesgotável de alimento e abrigo para os roedores. “Nós fornecemos muita comida e boas condições de sobrevivência para eles”, afirma Neide Ortêncio Garcia, do Centro de Controle de Zoonoses de São Paulo.

Tanto é assim que, dos milhares de tipos de roedores nas florestas capazes de sobreviver de vegetais e insetos, as três espécies mais numerosas do mundo são aquelas que vivem nos esgotos, nos depósitos e nas ruas das cidades. São elas a ratazana (Rattus norvegicus), o rato de telhado (Rattus rattus) e o camundongo (Mus musculus).

As grandes navegações, no século XIV, selaram de vez a aliança dos bigodudos conosco. A bordo das caravelas e de outras embarcações, essas três espécies se espalharam do seu local de origem – a Eurásia – para o resto do mundo. Poucas vezes, aliás, homens e roedores estiveram tão próximos. Eles infestavam os navios durante as grandes navegações.


Ratos se alimentavam da mesma comida que os marinheiros.

Matá-los ajudava os tripulantes a aliviar o tédio, mas também fornecia uma boa refeição. Um dos marinheiros de Fernão de Magalhães (1480-1521) – o comandante da primeira viagem ao redor do mundo – relatou que lamentava comer biscoitos que fediam a urina de rato e não conseguir nenhum desses animais para comer.

Pode parecer nojento, mas até hoje nós desfrutamos dos ratos como alimento. Os irulas, um povo que se espalha por várias partes da Índia, capturam milhares de ratos por ano, os cozinham e os colocam como ingredientes de uma farta (mas não necessariamente deliciosa) refeição. Para quem tem estômago forte e não se preocupa com doenças.

O Larousse Gastronomique, um dos mais importantes livros de culinária do mundo, traz uma receita em que ratazanas e ratos devem ser limpos, despelados, temperados com óleo e cebolas e grelhados em fogo alto. Para as pessoas de paladar tradicional, no entanto, ter ratos na despensa não significa ter um item a mais no cardápio do mês.

Mas apenas um problema difícil de resolver. Entre os vários truques que ratazanas e ratos de telhado desenvolveram para evitar nossos ataques, está uma habilidade especial em evitar armadilhas e devorar apenas a comida saudável. Não se trata de um sexto sentido ou de uma esperteza diabólica: eles simplesmente têm aversão a objetos

novos colocados em um ambiente conhecido, uma característica que os cientistas chamam de neofobia. Como as ratoeiras e o veneno são novidades, acabam intocados. Já a comida que estava lá… Por isso, as armadilhas não funcionariam mesmo que não existissem outros alimentos por perto. Os animais comeriam uma quantidade de veneno muito pequena

, insuficiente para matar todo o grupo, e o mal-estar que os sobreviventes sentiriam seria um alerta para nunca mais encostarem naquela comida. É como diz o ditado que ufana o conservadorismo: “O rato morreu de velho”.É preciso astúcia para capturar um rato. “Existem muitas estratégias para enganá-los”, afirma Neide.

Uma delas é colocar pequenos alimentos inofensivos durante dias, até que os ratos se acostumem a comê-los, e só depois acrescentar veneno. Outro truque é utilizar substâncias químicas que só fazem efeito mais de cinco dias depois de ingeridas, o que impede que os animais relacionem a morte de um deles ao alimento ingerido.


Por que exterminar os ratos?

Porque eles transmitem doenças ao ser humano. São pelo menos 55 enfermidades, segundo Normam Gratz, biólogo aposentado da Organização Mundial de Saúde (OMS), que listou doenças transmitidas direta ou indiretamente pelos rabudos. Mas ele mesmo reconhece que o número certamente é maior.

Nenhuma delas teve um impacto maior que a peste, que começou no século XIV, na Ásia, e invadiu a Europa em um famoso e cruel episódio. Durante uma batalha, guerreiros turcos, diante da impossibilidade de romper a muralha de uma cidade da Criméia, onde hoje é a Ucrânia, arremessaram cadáveres contaminados para dentro dos muros.


Por motivos desconhecidos, a epidemia sumiu.

Mas reapareceu várias vezes nos séculos seguintes. A versão atual surgiu na China no século XIX e tornou-se endêmica em diversas regiões do mundo, como em áreas do Nordeste brasileiro.Mas a lista de doenças graves transmitidas por roedores não termina aí. A leptospirose, por exemplo, uma infecção provocada por uma bactéria que causa febre

Dores e às vezes hemorragias e morte, é transmitida pela urina de ratos. A doença infecta centenas de pessoas todo ano e é um dos maiores riscos decorrentes de enchentes. E há ainda as enfermidades causadas por hantavírus, micróbios que vivem nas secreções dos roedores e são transmitidos pelo ar. Apesar de terem sido detectadas há poucas décadas

As doenças causadas por hantavírus já se espalharam pelo mundo e têm alto índice de letalidade. “Os ratos são uma rede global e subterrânea de transmissores de doenças”, diz Bartlett.Graças à diversidade existente entre elas, as três espécies de ratos adaptadas ao homem ocupam hábitats diferentes e acabaram por cobrir

Praticamente todas as possibilidades de convívio humano: camundongos, por exemplo, preferem lugares fechados (como um armário). Ratos de telhado são encontrados normalmente no ambiente que lhes dá o nome. Já as ratazanas costumam cavar buracos no chão e possuem uma habilidade impressionante para caminhar nesses túneis.

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